A questão do clima espacial e a atmosfera superior
A ionosfera. Imagem de Goddard Space Flight Center da NASA/Mary Pat Hrybyk-Keith
A atmosfera não termina na linha de Kármán (~100km), como indica a Aeronáutica Internacional. Na verdade, ela termina em partes. De fato, ao se chegar na heterosfera, a composição é estranhamente diferente quando comparado com a troposfera inferior, e, além disso, as propriedades dessa camada se diferenciam muito, a ponto de conhecermos menos as camadas superiores da atmosfera. Mas isso não significa que elas não sejam importantes, o fato de conhecer-se pouco de algo, não significa que ela é menos importante. Graças ao uso de satélites e instrumental cada vez mais aprimorado, a capacidade dos cientistas de entender os processos químico-físicos ganham novas perspectivas. E por que os efeitos naturais não podem ser vistos também como fatos geográficos?
A ionosfera não é uma camada, mas uma região situada entre a termosfera superior e a exosfera, caracterizada principalmente pela predominância de íons altamente reativos. Essas espécies químicas estão imersas em plasmas energizados, resultado da intensa presença de energia solar. A algumas centenas de quilômetros acima da Linha de Kármán. Essas reações incluem o nitrogênio e oxigênio em formas monoatômicas, geradas pela intensa fotodissociação — um processo eletromagnético que provoca a quebra permanente de moléculas. À medida que a altitude aumenta, a rarefação da atmosfera favorece a predominância de hidrogênio, seguida pelo hélio na exosfera. Além disso, nessa região (na camada da termosfera), atmosfera revela sua beleza com as auroras eletrometeóricas iluminando os polos na alta atmosfera, representando uma manifestação visível dessa região ainda pouco explorada.
O aspecto mais importante da ionosfera é sua capacidade de conduzir ondas de rádio, graças à estratificação de suas moléculas químicas de acordo com a massa molecular. Essa característica permitiu a divisão didática da ionosfera em subcamadas: D, E e F. A camada F (se dividindo entre F1 e F2 durante o dia), é a mais alta, é intensamente atingida por raios ultravioleta, enquanto a camada D é penetrada principalmente por raios X e cósmicos. As camadas da atmosfera, especialmente as superiores, atuam como filtros naturais, bloqueando radiações solares de alta energia e favorecendo as condições necessárias para a existência humana. Além disso, a composição e a dinâmica atmosférica dos planetas são elementos fundamentais para compreender sua trajetória evolutiva e geológica e sua diferenciação química complexa.
Essa disposição diferenciada é o que confere à ionosfera seu caráter geográfico. Aqui, o termo "geográfico" refere-se à utilização estratégica dessa região pela humanidade, especialmente por meio da construção de satélites de telecomunicação, que aproveitam as propriedades da ionosfera para viabilizar a globalização da informação. Desde a transmissão por rádio até os sistemas de GPS e outras formas de comunicação, essa interação entre tecnologia e características ionosféricas foi sabiamente explorada.
Por meio da “Ionosfera de Referência Internacional” (IRI), é possível estudar a atividade dos elétrons, incluindo densidade, temperatura e dinâmica, estabelecendo padrões globais para comunicações e observando variações espaciais e temporais na ionosfera. Essas variações dependem de fatores como latitude, ciclo diurno, estações do ano e fenômenos extraterrestres. Essa região está diretamente ligada ao chamado "Clima Espacial", que é influenciado por agentes como os ventos solares e o campo magnético terrestre, em contraste com as trocas de energia predominantes na Homosfera (que abrange camadas inferiores da atmosfera, como a troposfera e a estratosfera).
As ondas de GPS utilizam a camada F da ionosfera, e qualquer turbulência na densidade de elétrons nessa região, fato conhecido como cintilação, pode causar irregularidades repentinas e falhas no sistema. Além disso, subtempestades de fenômenos transitórios também afetam a esfera geomagnética da Terra. Outros fenômenos transitórios secundários incluem terremotos, grandes explosões artificiais (detonação nuclear) e explosões solares, todos com caráter passageiro. As ondas geradas na atmosfera inferior podem se propagar para a atmosfera superior por meio de infrassons e pela troca de energia entre camadas, ainda que de maneira espacialmente limitada. Isso contrasta com as ondas gravitacionais, que possuem um impacto em escala mais ampla.
Explosões vulcânicas, como a erupção do Monte Pinatubo em 15 de junho de 1991, podem ser detectadas na ionosfera superior de forma progressiva devido à perda de densidade com o aumento da altitude e à propagação por gravidade acústica. Esses eventos reforçam a ideia de que atividades terrestres podem influenciar a atmosfera superior. As plumas vulcânicas e partículas ejetadas, em alguns casos, geram tempestades elétricas que afetam essas camadas altas, embora estudos mais aprofundados ainda sejam necessários para compreender completamente esses processos. A resposta da atmosfera superior a fenômenos terrestres requer estimativas multiparamétricas, que continuam sendo menos compreendidas do que as interações da ionosfera com o campo geomagnético terrestre.
Referências usadas
Belakhovsky, Vladimir B., Yaqi Jin, and Wojciech J. Miloch. "Influence of different types of ionospheric disturbances on GPS signals at polar latitudes." Annales Geophysicae. Vol. 39. No. 4.
Göttingen, Germany: Copernicus Publications, 2021. Laštovička, Jan, and Tereza Šindelářová. "Large-scale and transient disturbances and trends: from the ground to the ionosphere." Infrasound Monitoring for Atmospheric Studies: Challenges in Middle Atmosphere Dynamics and Societal Benefits (2019): 777-804.
Tramutoli, Valerio, et al. "Tropospheric and ionospheric anomalies induced by volcanic and Saharan dust events as part of geosphere interaction phenomena." Geosciences 9.4 (2019): 177.
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