A mudança do paradigma geográfico do clima
Quando se trata do tema do “clima”, existem diferentes abordagens que se diferenciam em suas propostas e métodos. A primeira delas é a abordagem física, que analisa os contextos físicos de um clima passado e suas variações atuais. Nesse contexto, é essencial reconhecer os elementos físico-químicos que influenciaram essas mudanças, condensando-se no estudo das Mudanças Climáticas. Essa abordagem tem um caráter bastante próximo das ciências naturais, exigindo um conhecimento mais detalhado desses processos. Uma outra abordagem concentra-se nos estudos da relação climática com o chamado espaço humano. É nesse ponto que o texto se concentrará.
Na sua emergência como uma ciência da área física, a Climatologia, em grande parte da sua evolução, concentrou-se na análise dos elementos climáticos, como umidade, pressão e temperatura, assim como na natureza desses elementos. Essa análise seguiu uma perspectiva separatista, onde os fenômenos eram estudados de forma isolada e estática, principalmente para fins de classificação climática. Até o século passado, era comum produzir itinerários climáticos e verificar as variações desses elementos. Porém, essa abordagem era considerada 'aborrecida', termo utilizado por Monteiro, devido à sua simplificação da realidade e à descrição exaustiva, sem um propósito maior.
Não que o método tradicional não fosse importante. Com o desenvolvimento de instrumentos como o barômetro, termômetro e outras ferramentas de estudo, foi possível compreender os fenômenos atmosféricos. No entanto, essa abordagem ainda era restrita, pois estava desconectada da realidade. A verdade é que o clima sempre esteve ligado às questões sociais: por exemplo, no Egito Antigo, a vazão e as inundações demarcavam as estações do ano, e desde aquela época já se media a variação hidráulica. Além disso, estudos do século XIX e XX já observavam que os padrões climáticos mudam os fatos sociais e naturais, representando uma evolução silenciosa que só ganharia força a partir do século XX.
Inspirado pelas ideias francesas, Monteiro adotou a ideia de que o Clima não deveria ser apenas uma descrição simplista dos elementos atmosféricos, mas sim ser considerado fenômenos vinculados às dinâmicas de superfície. Outro estudioso, Sorre, revolucionou o paradigma do clima ao afirmar que este não é apenas o estado médio da atmosfera, mas sim a sua gênese e dinâmica, o que caracteriza cada tipologia como única e não genérica, como proposto pela classificação regional de Koppen. Assim, o clima foi formulado como um “fato geográfico”, relacionando o desenvolvimento dos fenômenos meteorológicos ao espaço geográfico.
Foi assim que Monteiro desenvolveu a noção de “análise rítmica”, na qual cada período forma um ritmo e se desdobra em um contexto em que os elementos não são mais vistos como isolados, mas sim como simultâneos e interligados. A sucessão habitual dos tipos de tempo são então resultado de uma complexa teia de fenômenos físicos relacionados, que precisam ser considerados em conjunto. Além dos elementos, os sistemas produtores de tempo, como as frentes, também desempenham um papel crucial. Estes modificam toda a dinâmica de um padrão atmosférico, mas muitas vezes não são identificados quando se analisa apenas o estado médio da atmosfera em um determinado período (Ex: 30 anos). A sucessão dos ritmos mensais, diários e horários reflete de forma mais precisa a realidade do clima.
Esses ritmos são então condensados em um gráfico que combina tanto os elementos climáticos quanto a circulação atmosférica, sendo este último um fator secundário, porém crucial para o método. É por meio desse cartograma gráfico que se pode visualizar as variações, diferenças e representações do clima regional. Não se trata apenas das variações na atmosfera, mas também das relações com os aspectos geográficos em complemento. Atualmente, é cada vez mais comum encontrar estudos que utilizam esse método associado a questões de saúde, principalmente. Outros fenômenos sociais também podem ser utilizados, se buscando correlações e descrições. No entanto, é importante ter cuidado para não reduzir essas correlações a uma mera relação de causa-efeito. Se houver um ritmo semelhante entre os dados analisados, é provável que haja alguma relação, mas isso não significa necessariamente uma causa direta.
O método parece interessante, porém não é fácil de ser aplicado. A maior dificuldade está em encontrar bancos de dados com uma amplitude de variáveis necessárias e sem muitas falhas. No caso dos dados primários, pode ser bastante oneroso instalar equipamentos que analisem mais de uma variável, o que é essencial para uma Análise Rítmica correta. Apesar da mudança de paradigma proposta por Monteiro, os estudiosos que aplicam esse método muitas vezes se deparam com esses impasses, o que acaba desmotivando-os. Além disso, o método é trabalhoso, pois requer uma confecção "manual" dos dados. No entanto, para fazer uma boa proposta de trabalho, é imprescindível dedicar mais tempo e esforço. Somente assim esse método poderá revelar muitas informações para o estudioso.
Referências usadas:
Cunha, D. G. F., & Vecchia, F. (2007). As abordagens clássica e dinâmica de clima: uma revisão bibliográfica aplicada ao tema da compreensão da realidade climática. Ciência e Natura, 29(1), 137-149.
Monteiro, C.A. de F.(org.) A Construção da Climatologia Geográfica no Brasil. Campinas: Alínea, 2015b.
Zavattini, J. A. (2000). O paradigma da análise rítmica e a climatologia geográfica brasileira. Geografia, 25-44.
Zavattini, JA, and MN BOIN. "Climatologia Geográfica: teoria e prática de pesquisa. Campinas: Alínea, 2013." Pontos Temáticos (exemplificativos) Teoria geral e Correntes de Pensamento da Ciência Geográfica.
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